sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Por Uma Dedicatória de Gullar


Há tempos precisava ir a São Paulo, mas adiava e adiava a viagem pelos simples fatos de não gostar muito de grandes deslocamentos e por preferir a cadeira na varanda de casa e o sorriso de minha filha que poltrona de avião. Calmamente esperei algum tempo até surgir a ocasião em que pudesse transformar necessidade em oportunidade. Foi quando soube que Ferreira Gullar autografaria seu livro mais recente, Em Alguma Parte Alguma, em uma livraria da capital paulista.
Solitário, em noite chuvosa, comprei via internet a bendita passagem e me hospedei na casa de um primo que me auxiliou nos deslocamentos por aquela cidade em constante frenesi. Compromissos cumpridos em prazo recorde para na data anunciada poder estar lá, na fila, entre amigos e fãs do maior poeta brasileiro vivo, à espera de uma dedicatória na folha de rosto do novo compêndio de poemas, e outra, em um livro que trago comigo como se fosse troféu, uma das raridades da minha modesta biblioteca, um exemplar da primeira edição do hoje clássico Poema Sujo.
O evento, marcado para as 19 horas, foi bastante agradável. Logo na entrada da livraria que fica na sede da editora, um banner com a imagem do autor, a capa do livro, e muita gente. Por volta das 20 horas chega o poeta agora octogenário, magro e menor que imaginava. Cumprimentou algumas pessoas, trocou rápidas palavras com outras e logo tomou assento.
Embora o público fosse grande, a espera foi curta. Meu primo, que sequer possui o hábito de ler poesia, não entendia tanta ansiedade, nem poderia. Chegada minha vez, não disse palavra alguma. Entrego-lhe, Em Alguma Parte Alguma. Gullar pergunta meu nome e sapeca a dedicatória: “Para Gustavo, com carinho”. Imediatamente após, passo-lhe às mãos o meu exemplar de Poema Sujo. Dessa vez o poeta para e, surpreso, olha-me nos olhos. “Gustavo, não é?”, ele pergunta. Respondo-lhe sem pestanejar: “Gustavo Felicíssimo”. “É seu sobrenome mesmo, filho?”. “Sim, e também sou poeta!” Gullar pensou um instante e então, a dedicatória: “Para Gustavo Felicíssimo, que traz a marca suja da vida”.

Lembrete:
Sobre Poema Sujo Vinicius de Moraes disse que é "o mais importante poema escrito em qualquer língua nas últimas décadas".

Ouça:
Ferreira Gullar na FLIP falando sobre o Poema Sujo:

8 comentários:

Hilton Deives Valeriano disse...

Fico feliz por você! Gullar é um gigante. Tomara que ele traga o Nobel este ano. Um abraço.

Anônimo disse...

Cronica maravilhosa, meu caro.
Abraços,
Tiago Groba

Anônimo disse...

Cronica muito boa! Maravilhosa, Gustavo.
Abraços!
Tiago Groba

Anônimo disse...

Cronica muito boa! Maravilhosa, Gustavo.
Abraços!
Tiago Groba

Jorge Elias Neto disse...

Se inveja matasse ...
Eu de cá fiquei com olhos marejados.
Realmente seu primo não poderia entender sua ansiedade.
Da próxima vez me liga que vamos juntos!
Bela crônica.
Abraço,

Fátima Santiago disse...

Havia tempos que não lia o seu blog, poxa, tava perdendo diversão! Crônica gostosa essa. Sim, esse seu primo é aquele maravilha que conheci aqui em Salvador? kkkkkkkk

Gustavo Felicíssimo disse...

Fatinha, minha querida, obrigado por sua visita e amizade. Não, esse primo não é aquele...

Poeta Silvério Duque disse...

Gustavo,

faço minhas as palavras de nosso amigo Hilton: "fico feliz por você"...

É uma bela crônica bem ritimada, objetiva e carregada de uma beleza que se vai descobrindo; beleza aliás que diz muito respeito a nós poetas, quando estamos diante, sim, de uma grande figura literária... de um gigante propriamente dito.

Abraço amigo,


Silvério Duque