quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Botando a leitura em dia 2


Outro livro que li recentemente, mas dessa vez lamentando vencer as suas quase 300 páginas, e talvez por isso ele continue  como obra de cabeceira, foi “Platero y yo”, um clássico de Juan Ramón Jimenez, Prêmio Nobel de Literatura de 1956, em belíssima edição bilíngüe da Martins Fontes, com tradução de Monica Stahel e ilustrações de Javier Zabala, publicado em 2010.
“Platero y yo” comumente é identificado como uma obra de literatura infantil, o que a meu ver é um julgamento apressado. Essa caracterização se dá por conta de ser uma obra de poderosa verve lírica e linguagem ao nível da fala comum, contrastando com a natureza, a simplicidade das pessoas e da aldeia de Moguer, onde nasceu o escritor.
Platero é um burrico que acompanha o Eu da história por onde vá. Ele parece ser a consciência de Jimenez, e Eu, o seu alter ego, fazendo ruir a ponte entre personagem e narrador. Juntos caminham pelos campos, vales, montes e vilas vizinhas, de primavera a primavera, o que dá à obra uma condição cíclica, repleta de espontaneidade que, como sabemos, é também um recurso literário.
 Em 138 capítulos de pouco menos de uma lauda cada um, “Platero y yo” vivem situações amargas e dolorosas, ao lado de outras felizes e divertidas, somadas às histórias e recordações que o escritor tem do local, sendo que cada um deles pode ser lido como uma unidade autônoma dentro do todo, o que possibilita que a obra possa ser lida de maneira linear ou aleatória.

LXXXI – A MENININHA

A menininha era a glória de Platero. Quando a via chegar a seu encontro, entre os lilás, com seu vestidinho branco e seu chapéu de arroz, chamando-o, dengosa: - Platero, Plateriinho! -, o burrinho queria arrebentar a corda, e saltava como um menino, e zurrava como um louco.
Ela, em cega confiança, passava uma e outra vez por baixo dele, e lhe dava tapinhas, e punha a mão, nardo cândido, naquela bocarra cor-de-rosa, ameada de dentes amarelos; ou, pegando-lhe as orelhas, que ele punha a seu alcance, chamava-o por todas as variações mimosas de seu nome: - Platero!, Platerão!, Platerinho!, Platerete!, Platerucho!.
Nos longos dias em que a menina navegou rio abaixo em seu berço branco, para a morte, ninguém se lembrava de Platero. Em seu delírio, ela o chamava triste: Platerinho!... Vindo da casa escura e cheia de suspiros, ouvia-se, às vezes, o longínquo clamor lastimoso do amigo. Oh , estio tão melancólico!
Que luxo Deus pôs em ti, tarde do enterro! Setembro declinava, rosa e ouro como agora. Do cemitério, como ecoava o sino no ocaso aberto, caminho da glória!... Voltei pelos muros, sozinho e melancólico, entrei na casa pela porta do curral e, fugindo dos homens, fui para o estábulo e me sentei a pensar, com Platero.

Biografia completa e textos do autor:

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