domingo, 21 de dezembro de 2008

Confiram a breve entrevista que concedi ao Jorge Augusto, jovem poeta e estudante de Letras.

Jorge Augusto - Você foi editor do tablóide literário SOPA e lançou faz pouco tempo a revista Poesia & Afins, como foi a recepção dessa revista, qual a sua intenção e como você vê o mercado editorial baiano?
Gustavo Felicíssimo
– Não há mercado editorial baiano, isso não existe por aqui, pois não temos uma indústria editorial forte, que apóie o escritor local, que distribua sua obra, como acontece no Rio Grande do Sul, por exemplo. Fora as editoras gaúchas, no Brasil, apenas Rio e São Paulo possuem esse mercado. Quanto à revista, o que posso dizer é que os escritores a receberam muito bem, mas o que fica cada dia mais claro é que não há público leitor de poesia fora desse meio. Da quantidade vendida, menos de 10% do total foi adquirida pelo não escritor. Dificilmente repetirei um trabalho como esse.

JA - No número um da revista Poesia & Afins, você dedica um grande espaço ao Bruno Tolentino e o classifica como um dos maiores poetas lusófonos. O que para você faz desse poeta um destaque na poesia nacional?
GF
– Nosso objetivo era editar números temáticos, nosso próximo poeta seria o Alberto da Cunha Melo. Bruno foi um autor formidável, refinado e diferenciado, tanto que foi o único a vencer três vezes o Jabuti. Sua poesia exige alguma leitura prévia, mas é prazerosa. Ele dialoga com as tradições e com a modernidade, é inventivo e irônico. Qualquer escritor que tenha essas qualidades poderá por certo ser considerado um grande escritor.

JA - Como você vê o panorama atual da poesia feita na Bahia e no Brasil, se possível?
GF
– Essa é uma opinião muito pessoal e que trata de algumas questões subjetivas. O que vejo é que existem inúmeros poetas realmente talentosos, no entanto, muitos deles, a grande maioria, não possuem o que chamo de “consciência literária”. Por vezes esses autores se mostram tão inventivos que se esquecem de dar um sentido lógico à sua obra. Creio que essa é uma herança negativa (apesar das inúmeras contribuições) que herdamos dos modernistas. Isso acontece porque o chamado “verso livre” também se ritualizou e trouxe consigo inúmeros poetas cujo pressuposto é o desconhecimento das tradições.
Mas como a literatura vive de ciclos, a esperança se renova sempre que identificamos um poeta, ou um grupo diferenciado deles. Eu e parte da minha “turma”, estudamos versificação e criação literária com a mestra Maria da Conceição Paranhos, outros com o Ildásio Tavares, alguns de maneira autônoma. Mas isso não significa que defendo que todo mundo precise escrever e publicar sonetos ou redondilhas, e sim que é inegável o crescimento que tal estudo proporciona, inclusive no verso livre que, acredite, de livre não tem coisa alguma. Nossa poesia, retratada na poesia daqueles que valorizam o verso, é muito boa!

JA - Como você percebe essa relação internet x mídia impressa no escoamento e na construção da literatura nacional contemporânea?
GF
- A mídia impressa ligada à literatura no Brasil é muito incipiente e seu conteúdo está voltado para os vestibulares, por isso é superficial. Já os cadernos literários dos jornais que ainda sustentam esse tipo de publicação, cada vez mais são lidos apenas por escritores e alguns apaixonados. Como diz Alberto da Cunha Melo no poema CASA VAZIA, escrevemos para esse público dos ermos/ composto apenas de nós mesmos. Por outro lado, a facilidade de se publicar via internet esconde um sem fim de coisas que sequer merecem serem lidas.

JA - Quem você destaca como figura importante nos últimos anos para a poesia brasileira?
GF
– Tenho lido alguns poetas formidáveis que são desconhecidos do grande público. A obra do Alberto da Cunha Melo, por exemplo, tornou-se referência para mim. O Bruno Tolentino em um ensaio diz o seguinte: se ele escrevesse naquela meia dúzia de idiomas com que por décadas convivi, digamos, mais intimamente; se escrevesse em qualquer delas, este autor já estaria em todas as bocas a caminho de Estocolmo...

JA – Por que você ainda não se deixou publicar em livro?
GF
– Oportunidades não faltaram, mas o fato de ter sido editor do SOPA e da POESIA & AFINS me ajudou a conter o impulso de publicar antes do tempo, o que não acontece com a maioria dos escritores. Mesmo assim, como tal conceito é muito subjetivo, corro ainda o risco de me arrepender, só que hoje, menos que ontem.

JA – Mas você já deve estar se preparando...
GF
- Sim, só que um livro de poesia precisa de unidade, de um fio condutor que perpasse o conjunto de poemas ali inseridos, e isso não se faz da noite para o dia. Não se trata de reunir uma porção aleatória de poemas e publicá-los.
Tenho um livro ao qual me dedico há sete anos e que agora o considero pronto. Pretendo lançá-lo ainda neste ano de 2009, chama-se PROCURA, ele deverá sair acompanhado de um cd. Outros livros, um contendo ensaios sobre os poetas da região cacaueira da Bahia, outro, uma nova antologia de poetas grapiúnas, também estão previstos para saírem 2009.

JA – O que tem sido motivo de alegria para o poeta?
GF
– Viver entre Itabuna e Ilhéus está me fazendo muito bem, aqui sou mais feliz e, conseqüentemente, escrevo mais solto, melhor, talvez.

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