sábado, 5 de março de 2011

O Som dos Cavalos Selvagens


Conta Ferreira Gullar que durante a ditadura militar no Brasil foi convidado a fazer parte do MR-8 e pegar em armas na Guerrilha do Araguaia. Sabiamente não entrou naquela furada, pois a sua trincheira estava onde melhor poderia colaborar, na poesia. Caso a escolha fosse outra, provavelmente não teríamos uma obra pulsante e vigorosa como é, por exemplo, Poema Sujo.
Do mesmo modo que Gullar, muitos poetas ficaram para contar, cada um à sua maneira, a história e expor as marcas desse período que permaneceram no tecido inconsciente da nação, uma vez que o discurso poético naquele momento estava permeado por uma natureza de essência política e humanitária que procurava combater as iniquidades.
  Entretanto, foram poucos os poetas que conseguiram aliar o discurso social à estética literária, um deles foi o baiano Adelmo Oliveira, pois não justificou seus pressupostos com finalidades alheias ao que é decisivo e inalienável em uma obra de arte, o seu plano estético.
Os poemas criados por Adelmo nessa época estão reunidos em “O Som dos Cavalos Selvagens”, cujo título tomo emprestado para essa crônica. São poemas que trazem aquela ideia de Bandeira sobre o poeta sórdido, que é aquele cuja poesia traz a marca suja da vida (Nova Poética).
Pois bem. Relendo aleatoriamente, e pela enésima vez, alguns poemas da sua obra reunida (e muito mal editada pela Escrituras) em “Canto Mínimo & Poemas da Vertigem”, tive aquela impressão benfazeja que apenas o grande poeta consegue nos proporcionar, justamente por ter a consciência de que para impressionar nossa percepção, a mensagem, a ideia, que pretende exprimir em sua obra deve estar inseparável do código em que está envolta. Ou seja: forma e conteúdo constituem uma unidade, uma construção com estrutura e significado, que potencializa a comunicação com o leitor.
É justamente por essas qualidades que o poeta e crítico Izacyl Guimarães Ferreira, ao se referir à obra de Adelmo Oliveira, com muita propriedade afirma que chega a ser deplorável que um poeta deste porte, não tenha o reconhecimento (nacional) da sua arte.

O Som dos Cavalos Selvagens
(Adelmo Oliveira)

Dentro da noite
e pelo dia
um eco surdo
de ventania

Sobe a montanha
transpõe o vale
– A fúria avança
– A sombra invade

Marca no tempo
finas esporas
– Um cata-vento
no fio das horas

Patas de ferro
porta fuzis
deixa no vento
a cicatriz

Dentes de faca
olhos de fogo
cuspindo raiva
do próprio rosto

Destrói cidades
e espanca a luz
por onde passa
finca uma cruz

Tempo de guerra,
este é meu tempo
– Cavalos de ódio
no pensamento

Clicando AQUI poderá baixar o livro na íntegra.

Um comentário:

Anônimo disse...

Pedro Lira, doutor em poética, organizou a antologia da geração sessenta no Brasil que vai sair pela Global Editora. Nesta antologia Adelmo comparece para mostrar ao Brasil o quanto a sua poética é valiosa, para nós baianos seus fãs, e o Brasil que ainda não lhe conhece. Minto, Manuel Bandeira lhe ourtorgou um prêmio na distante década de 60. Adelmo, com sua natureza eremita e sem puxar saco de ninguém vem construindo há trinta anos uma voz poética inigualável em terras baianas onde todo mundo quer ser poeta na tora. Miguel Carneiro