Ao contrário do que imaginamos, em
Castro Alves: Um Poeta Sempre Jovem, Alberto da Costa e Silva afirma que não há
na poesia do poeta da liberdade nenhum indício de que ele tenha, algum dia, se
demorado em conversas com um escravo africano sobre sua história e condição. Os
exemplos de maus tratos, humilhações e perversidades que figuram em seus versos
seriam pertencentes a um repertório de histórias que alimentavam a pregação
abolicionista. Repertório esse que Castro Alves aproveitou como ninguém.
Poemas
como “Bandido Negro” eram considerados como incitação ao crime, pois louvavam
os grupos de africanos e crioulos que, armas na mão, atacavam as fazendas.
Imagino que um poema como esse devia enfurecer os escravocratas. Acompanhe.
Bandido
Negro
(Castro Alves)
Trema a terra de susto
aterrada...
Minha égua veloz,
desgrenhada,
negra, escura nas lapas
voou.
Trema o céu... ó ruína!
ó desgraça!
Porque o negro bandido
é quem passa,
porque o negro bandido
bradou:
Cai orvalho de sangue
do escravo,
cai, orvalho, na face
do algoz.
Cresce, cresce, seara
vermelha,
cresce, cresce,
vingança feroz.
(...)
E o senhor que na festa
descanta
pare o braço que a taça
alevanta,
coroada de flores
azuis.
E murmure, julgando-se
em sonhos:
"Que demônios são
estes medonhos,
que lá passam famintos
e nus"?
(...)
Somos nós, meu senhor,
mas não tremas,
nós quebramos as nossas
algemas
para pedir-te as
esposas e mães.
Este é o filho do
ancião que mataste.
Este - irmão da mulher
que manchaste...
Oh! não tremas, senhor,
são teus cães.
(...)
São teus cães, que tem
frios e tem fome,
que há dez séculos a
sede consome...
Quero um vasto banquete
feroz...
Venha o manto que os
ombros nos cubra.
Para vós fez-se a
púrpura rubra.
Fez-se o manto de
sangue para nós.
(...)
Meus leões africanos,
alerta!
Vela a noite... a
campina é deserta.
Quando a lua esconder
seu clarão
seja o bramo da vida
arrancado
no banquete da morte
lançado
junto ao corvo, seu
lúgubre irmão.
(...)
Trema o vale, o rochedo
escarpado,
trema o céu de trovoes
carregado,
ao passar da rajada de
heróis,
que nas éguas fatais
desgrenhadas
vão brandindo essas
brancas espadas,
que se amolam nas
campas de avós.
Cai orvalho de sangue
do escravo,
cai, orvalho, na face
do algoz.
Cresce, cresce, seara
vermelha,
cresce, cresce,
vingança feroz.
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