segunda-feira, 14 de março de 2011

Bandido Negro


Ao contrário do que imaginamos, em Castro Alves: Um Poeta Sempre Jovem, Alberto da Costa e Silva afirma que não há na poesia do poeta da liberdade nenhum indício de que ele tenha, algum dia, se demorado em conversas com um escravo africano sobre sua história e condição. Os exemplos de maus tratos, humilhações e perversidades que figuram em seus versos seriam pertencentes a um repertório de histórias que alimentavam a pregação abolicionista. Repertório esse que Castro Alves aproveitou como ninguém.
Poemas como “Bandido Negro” eram considerados como incitação ao crime, pois louvavam os grupos de africanos e crioulos que, armas na mão, atacavam as fazendas. Imagino que um poema como esse devia enfurecer os escravocratas. Acompanhe.

Bandido Negro
(Castro Alves)

Trema a terra de susto aterrada...
Minha égua veloz, desgrenhada,
negra, escura nas lapas voou.
Trema o céu... ó ruína! ó desgraça!
Porque o negro bandido é quem passa,
porque o negro bandido bradou:

Cai orvalho de sangue do escravo,
cai, orvalho, na face do algoz.
Cresce, cresce, seara vermelha,
cresce, cresce, vingança feroz.

(...)

E o senhor que na festa descanta
pare o braço que a taça alevanta,
coroada de flores azuis.
E murmure, julgando-se em sonhos:
"Que demônios são estes medonhos,
que lá passam famintos e nus"?

(...)

Somos nós, meu senhor, mas não tremas,
nós quebramos as nossas algemas
para pedir-te as esposas e mães.
Este é o filho do ancião que mataste.
Este - irmão da mulher que manchaste...
Oh! não tremas, senhor, são teus cães.

(...)

São teus cães, que tem frios e tem fome,
que há dez séculos a sede consome...
Quero um vasto banquete feroz...
Venha o manto que os ombros nos cubra.
Para vós fez-se a púrpura rubra.
Fez-se o manto de sangue para nós.

(...)

Meus leões africanos, alerta!
Vela a noite... a campina é deserta.
Quando a lua esconder seu clarão
seja o bramo da vida arrancado
no banquete da morte lançado
junto ao corvo, seu lúgubre irmão.

(...)

Trema o vale, o rochedo escarpado,
trema o céu de trovoes carregado,
ao passar da rajada de heróis,
que nas éguas fatais desgrenhadas
vão brandindo essas brancas espadas,
que se amolam nas campas de avós.

Cai orvalho de sangue do escravo,
cai, orvalho, na face do algoz.
Cresce, cresce, seara vermelha,
cresce, cresce, vingança feroz.

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