A SEGUNDA PARTIDA
A segunda partida aconteceu em um ensolarado dia de domingo, pela tarde, e como estava em casa, de lá mesmo fui ao estádio que fica a menos de trezentos metros de onde morávamos. Durante a semana, a expectativa havia sido grande, tanto para mim quanto para meus colegas, pois seria a primeira vez que jogaríamos no Bento de Abreu, um campo enorme para aqueles que não estavam acostumados aos padrões oficiais, apenas aos campinhos do educandário e alguns outros do bairro. Seria uma barra.
Peguei meus apetrechos, chuteira, caneleira e meião, os coloquei na sacola, me despedi da minha mãe, do garninsé, e peguei meu rumo. Logo de cara encontrei com Flávio, também conhecido como Astromar, contei sobre o jogo e ele, claro, não acreditou. O deixei no portão de sua casa e segui, ganhei a Rua Vicente Ferreira, passei em frente a uma casa que vendia frango assado naqueles cineminhas de cachorro e em frente ao Karica, cuja calçada, àquela hora, já estava cheia de homens tomando a sua cerveja e beliscando uns petiscos. Parei no bar do pai do Hideo, japonês bom de bola, para comprar chicletes. Foi o próprio Hideo que me atendeu. Contei ao meu amigo sobre o jogo daquela tarde, mas ele, do mesmo modo que Flávio, também duvidou de mim. Nem liguei. Peguei meus chicletes e em instantes me encontrei com a turma toda e nossos educadores em frente ao estádio. Todos estavam apreensivos.
Qualquer boleiro gostaria de estar no meu lugar, por isso ninguém acreditou que jogaria uma partida no mesmo local onde já pisaram craques como Sócrates e Ademir da Guia, Dario Pereira ou Dicá, o tapete consagrado do Abreuzão, o mesmo local onde Zé Guimarães desfilava semanalmente o seu charme desengonçado e que naquela tarde, além dos meus dribles, receberia a trupe do Cilinho: Silas, Muller, Sidney, Raí e Cia. Acho que nem minha mãe acreditou muito em mim.
Entramos por um dos portões laterais e nos trocamos atrás do muro onde antigamente funcionava o placar do estádio. Dali podia ouvir o burburinho da torcida chegando. Tive calafrios. Cruzamos a pista de atletismo, a caixa de salto a distância, os poucos metros que nos separavam da linha de fundo e pisamos o campo com o pé direito, que é pra não dar zica. O juiz chamou todos ao círculo central e explicou: “esse é um jogo comemorativo, não quero ver ninguém dar pancada”, “entendido?”. Colocou a bola no centro, chamou os capitães, tirou par ou ímpar e deu início à peleja.
Daquela vez, além de colocar um lateral para me marcar, o técnico adversário também havia providenciado outro jogador para ficar na sobra, o que veio a dificultar muito as minhas ações. Até quando eu vinha procurar jogo na intermediária um deles estava no meu calcanhar, me perseguindo, segurando minha camisa mesmo quando estava longe da jogada. Um horror! E como se não bastasse, eles ainda abriram o placar no finalzinho do primeiro tempo.
Um a zero pra eles. Será que sofreríamos a primeira derrota para a filantrópica logo naquele dia? Eu não podia acreditar! Veio o intervalo e Genaro queria me substituir, mas Seo Adão o convenceu a me colocar para jogar no lado oposto, na ponta esquerda, dessa vez, “caindo pelo meio”, dizia ele.
Faltava menos de uma hora para iniciar o jogo do Marília contra o São Paulo e o estádio estava bem cheio. Sol a pino, havia chegado a hora de dar um pouco mais. Chamei Edvane, o nosso centro-avante, e recomendei que chegasse mais junto de mim, que ficasse por perto para fazermos umas tabelinhas como fazíamos no time do campeonato interno do educandário.
Não deu outra. Logo na primeira jogada deixamos o marcador a ver navios e ganhamos um escanteio. Como não conseguíamos centrar a bola do local original, na junção da linha lateral com a linha de fundo, como fazem os profissionais, o juiz a pôs na marca de grande área. Fui para a cobrança, pois era, no meu time, o menino que tinha mais força nas pernas. Ajeitei a bola com carinho, reuni todas as minhas energias e dei um chutão que saiu rasteiro, no meio do bolo, ao invés de ir por cima, na cabeça, como desejava. Por sorte, a bola passou por todo mundo, mas não passou pelo Edvane, que concluiu de chapa, empatando o jogo.
Participei do jogo todo com entusiasmo, me esforcei, mas, pelo que podem ver, não foi o suficiente para levarmos a vitória pra casa. O jogo terminou mesmo empatado. Eu queria muito ganhar aquela partida e também fazer um gol, mas talvez não fosse bom o bastante quanto o Fernando Sabino que, diz ele, em seu “O menino no espelho”, teria entrado com bola e tudo na meta adversária, jogando entre os adultos. Isso, depois de driblar um e outro, deixando para traz a defesa adversária, passando debaixo das pernas do goleiro para marcar o gol da vitória do seu time. Exatamente como eu gostaria de fazer.
A segunda partida aconteceu em um ensolarado dia de domingo, pela tarde, e como estava em casa, de lá mesmo fui ao estádio que fica a menos de trezentos metros de onde morávamos. Durante a semana, a expectativa havia sido grande, tanto para mim quanto para meus colegas, pois seria a primeira vez que jogaríamos no Bento de Abreu, um campo enorme para aqueles que não estavam acostumados aos padrões oficiais, apenas aos campinhos do educandário e alguns outros do bairro. Seria uma barra.
Peguei meus apetrechos, chuteira, caneleira e meião, os coloquei na sacola, me despedi da minha mãe, do garninsé, e peguei meu rumo. Logo de cara encontrei com Flávio, também conhecido como Astromar, contei sobre o jogo e ele, claro, não acreditou. O deixei no portão de sua casa e segui, ganhei a Rua Vicente Ferreira, passei em frente a uma casa que vendia frango assado naqueles cineminhas de cachorro e em frente ao Karica, cuja calçada, àquela hora, já estava cheia de homens tomando a sua cerveja e beliscando uns petiscos. Parei no bar do pai do Hideo, japonês bom de bola, para comprar chicletes. Foi o próprio Hideo que me atendeu. Contei ao meu amigo sobre o jogo daquela tarde, mas ele, do mesmo modo que Flávio, também duvidou de mim. Nem liguei. Peguei meus chicletes e em instantes me encontrei com a turma toda e nossos educadores em frente ao estádio. Todos estavam apreensivos.
Qualquer boleiro gostaria de estar no meu lugar, por isso ninguém acreditou que jogaria uma partida no mesmo local onde já pisaram craques como Sócrates e Ademir da Guia, Dario Pereira ou Dicá, o tapete consagrado do Abreuzão, o mesmo local onde Zé Guimarães desfilava semanalmente o seu charme desengonçado e que naquela tarde, além dos meus dribles, receberia a trupe do Cilinho: Silas, Muller, Sidney, Raí e Cia. Acho que nem minha mãe acreditou muito em mim.
Entramos por um dos portões laterais e nos trocamos atrás do muro onde antigamente funcionava o placar do estádio. Dali podia ouvir o burburinho da torcida chegando. Tive calafrios. Cruzamos a pista de atletismo, a caixa de salto a distância, os poucos metros que nos separavam da linha de fundo e pisamos o campo com o pé direito, que é pra não dar zica. O juiz chamou todos ao círculo central e explicou: “esse é um jogo comemorativo, não quero ver ninguém dar pancada”, “entendido?”. Colocou a bola no centro, chamou os capitães, tirou par ou ímpar e deu início à peleja.
Daquela vez, além de colocar um lateral para me marcar, o técnico adversário também havia providenciado outro jogador para ficar na sobra, o que veio a dificultar muito as minhas ações. Até quando eu vinha procurar jogo na intermediária um deles estava no meu calcanhar, me perseguindo, segurando minha camisa mesmo quando estava longe da jogada. Um horror! E como se não bastasse, eles ainda abriram o placar no finalzinho do primeiro tempo.
Um a zero pra eles. Será que sofreríamos a primeira derrota para a filantrópica logo naquele dia? Eu não podia acreditar! Veio o intervalo e Genaro queria me substituir, mas Seo Adão o convenceu a me colocar para jogar no lado oposto, na ponta esquerda, dessa vez, “caindo pelo meio”, dizia ele.
Faltava menos de uma hora para iniciar o jogo do Marília contra o São Paulo e o estádio estava bem cheio. Sol a pino, havia chegado a hora de dar um pouco mais. Chamei Edvane, o nosso centro-avante, e recomendei que chegasse mais junto de mim, que ficasse por perto para fazermos umas tabelinhas como fazíamos no time do campeonato interno do educandário.
Não deu outra. Logo na primeira jogada deixamos o marcador a ver navios e ganhamos um escanteio. Como não conseguíamos centrar a bola do local original, na junção da linha lateral com a linha de fundo, como fazem os profissionais, o juiz a pôs na marca de grande área. Fui para a cobrança, pois era, no meu time, o menino que tinha mais força nas pernas. Ajeitei a bola com carinho, reuni todas as minhas energias e dei um chutão que saiu rasteiro, no meio do bolo, ao invés de ir por cima, na cabeça, como desejava. Por sorte, a bola passou por todo mundo, mas não passou pelo Edvane, que concluiu de chapa, empatando o jogo.
Participei do jogo todo com entusiasmo, me esforcei, mas, pelo que podem ver, não foi o suficiente para levarmos a vitória pra casa. O jogo terminou mesmo empatado. Eu queria muito ganhar aquela partida e também fazer um gol, mas talvez não fosse bom o bastante quanto o Fernando Sabino que, diz ele, em seu “O menino no espelho”, teria entrado com bola e tudo na meta adversária, jogando entre os adultos. Isso, depois de driblar um e outro, deixando para traz a defesa adversária, passando debaixo das pernas do goleiro para marcar o gol da vitória do seu time. Exatamente como eu gostaria de fazer.
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