segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Um poema puxa outro - III


Em Diálogos – Panorama da Nova Poesia Grapiúna, publiquei, de Piligra, entre outros, o poema “Concepção”. Trata-se de um soneto, cujo verso escolhido foi o Alexandrino Trímetro, onde o poeta discorre sobre seu modo de composição, semelhante ao de um “arquiteto que planeja um edifício”. É, por assim dizer, uma forma clássica de poesia, dentro da qual o autor melhor se ajusta, “sem perguntar se isto é fácil ou difícil”. Essa predisposição nasce de uma necessidade pessoal, pois a forma escolhida se encontra internalizada, e assim, amalgamada ao fazer do poeta, embora ele também transite – com menor frequência – pelo verso livre, decassílabos e redondilhas.
Foi com esse poema do Piligra que procurei dialogar em “Inóspita Claridade”, compondo o meu como se fosse uma continuidade do original, não o seu espelho, em que ao invés de planificar um tratado sobre um modo particular de escrever, procuro antes os motivos que me levam a fazê-lo, uma espécie de profissão de fé, sintetizada nas últimas palavras dos três versos finais. Quais sejam: esperança – liberdade – verdade. Eis tudo que acredito ser a razão do fazer poesia.

Concepção
Piligra

eu já concebo o verso assim metrificado
como arquiteto que planeja um edifício
na exatidão do prumo reto e equilibrado
sem perguntar se isto é fácil ou difícil!

eu já concebo a rima assim – intercalada,
numa urdidura trabalhosa e singular –
puxando o fio de cada sílaba marcada
pelo tecido de uma métrica “sem par”!

eu já concebo o meu soneto alexandrino
(como a matriz de uma equação vetorial)
fazendo cálculo semântico e verbal,

com meu compasso atrapalhado de menino!
eu já concebo o meu poema ornamental
como operário que dá forma ao que é divino!


Inóspita Claridade
Gustavo Felicíssimo

Eu faço versos por viver na poesia
todo universo do real e do abstrato,
feito um menino que contempla a fantasia
enquanto bárbaros renegam seu retrato.

Eu faço versos porque vejo a claridade
do novo tempo que está prestes a nascer,
quando irmanados e distante a falsidade
a humanidade poderá se conhecer.

Verá sua face no sorriso da criança,
em cada gesto de modéstia ou de virtude:
no seu semblante verá toda plenitude.

Verá que a luz se faz presente e a esperança,
palavra viva, vem somar-se à liberdade,
reconduzida ao seu lugar, junto à verdade.

2 comentários:

Anônimo disse...

Admiro quem concebe na poesia a pureza. Para mim, pureza é apenas um tema.

Piligra e Gustavo, segundo sei, conseguem fazer bons trabalhos em duo.

Eis mais um.

Parabéns!

Luis Fernando disse...

Com uma lijeira quedinha a mais para o primeiro soneto, mas sem deixar de reconhecer a qualidade na simplicidade do segundo, me seduz a poesia de pés no chão como a sua. Tô cansado do prolixo, das viagens sem volta, das criaturas esquisitas que lemos por aí.