terça-feira, 2 de agosto de 2011

Os poetas e as cidades


Cidade natal de todo escritor, mais dia, menos dia, sempre aparece influenciando a escrita através da memória afetiva. Às vezes as referências são diretas, às vezes sutis. Certo mesmo é que tais alusões surgem de modos distintos e a depender de como é - ou foi - a convivência e a aceitação do autor em seu chão. Essa relação se torna direta na medida em que se aceita ou se nega a cidade e o que ela, na visão do autor, tem a oferecer ou não.
No Brasil, os melhores exemplos são Drummond, que cantou Itabira; Bandeira, que cantou o Recife, Gullar que cantou São Luiz do Maranhão, entre outros que agora não me lembro. Octávio Mora – apesar de ser carioca – em Ausência Viva cantou inúmeras cidades mineiras, de onde descende sua mãe. Com ele inauguro uma série de postagens que farei durante esta semana com poetas que cantaram suas cidades natais ou afetivas.
O leitor, caso queira me enviar algum poema sobre a sua cidade, à medida do possível, poderei publicá-lo. Eis o e-mail para corrspondência: gfpoeta2@hotmail.com

OURO PRETO – 3
Octávio Mora
I
Esta ciudad, que, periclitante,
ha tantos siglos que se viene abajo.
(Gôngora)

Aqui, dirão, foi Ouro Preto.
Sobe e desce a sua sombra
a procurar-se no tempo,
mas nada resta. E é tudo.
Suas íngremes ladeiras
imóveis, fora do tempo,
bateiam a água da chuva
para o fundo mais pesado.
E as casa desbam, podres.
Igrejas, quantas igrejas
restam ainda? Nenhuma
pode sair do seu adro.
As igrejas estão presas
nesta Ouro Preto vazia.
Seus santos de faces fundas,
de olhos fitos no invisível
contemplam-se mortos, mudos.
A palidez de seus Santos
escorre pelas paredes
e tudo é chuva. Nublado,
o céu de Ouro Preto pesa
e tudo se desconjunta.
As casas e os homens, tudo.
A própria luz desmorona
com as casas de Ouro Preto.
E um dia será mais nada.
Escombros, e sob a terra
profetas, deuses e santos
apodrecendo-se mútuos.
O círculo das montanhas
cada vez mais apertado
envolve Ouro Preto morta.

*Para conhecer melhor Octávio Mora clique AQUI.

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