sábado, 3 de abril de 2010

Carlos Falck, exímio e sofrido poeta

Segundo Henrique Wagner, Falck não teve educação formal, mas se submeteu a uma prova para entrar à Escola de Teatro da Bahia e passou, inteligente, culto e perfeccionista que era. E mesmo sem concluir os cursos preparatórios acabou ingressando no nível superior para tornar-se um dos mais incissivos críticos de teatro, assinando uma coluna muito lida, no extinto Jornal da Bahia.
Sua produção poética estende-se por dez anos, de 1954 a 1964, quando comete o suicídio. Seus sonetos, segundo Ildásio, são lapidares e suas redondilhas revestem de inovação a medida medieval construindo versos com um grande sabor de atualidade, mesmo quarenta anos após ter feito seu último poema.
Sua poesia, basicamente existencialista, possui certa obscuridade que nos faz lembrar muitas vezes de Fernando Pessoa. Percebam o segundo poema, trata-se de uma carta suicida deste que foi um exímio e sofrido poeta.

Cântico da Noite Triste
A todas as mães

Pelos versos noturnos que componho
Há passos vagarosos de mulheres
Nas estradas do vício – malmequeres
Feitos de sombra e luz, de choro e sonho...

Na convulsão de ilícitos misteres
Em que falece a vida, eu me envergonho
Das palavras de Amor que tu proferes
E a resistência da moral transponho,

E o lupanar de pompas tumultuário
Toma a lição macabra de um Calvário,
E cada leito a forma de uma cruz,

Em cujos braços, plenos de pecados
Vejo o Direito e a Fé crucificados
Como o corpo sangrento de Jesus!

Sexta-feira Santa de 1956.


Bilhete à Ilha

Mudarei meu silêncio em ventania
E meu andar para o norte em ir ao cais;
Não me perguntarei se vou ou vais
ao mesmo ponto que antes nos unia.

Apenas caminharei e nesse andar
descobrirei se me segues ou te sigo.
Não me importo lembrar (se não te digo)
o que lembro se avisto cais ou mar.

Pois vou ao porto como se não fosse.
Desligado do sonho e dos sentidos
descubro que não tenho mais amigos
e que o verde do mar jamais foi doce.

E mais descobrirei quando bem frio,
meu corpo navegar no mar vazio.
Nota:
Poemas retirados do livro Ofício de Cancioneiro e Outros Poemas, organizado por Ildásio Tavares e publicado pela Imago dentro da coleção Bahia: Prosa & Poesia.

Outros poemas do autor em:
http://www.jornaldepoesia.jor.br/cfrank.html

2 comentários:

Evandro L. Mezadri disse...

Belíssimos sonetos, muito ricos. Merecida homenagem. Me interessei muito pelo poeta, vou pesquisar mais.
Grande abraço e sucesso!

Renata Magalhães disse...

Gustavo, escolhi seu blog para o Prémio Dardos. Veja no meu o que fazer :)

Abraço