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terça-feira, 6 de novembro de 2012

JUAN RULFO & LEMINSKI NAS RETRANCAS DE GUSTAVO FELICÍSSIMO


Por Carlos Verçosa

Gustavo Felicíssimo, poeta paulista novobaiano, haikaista, editor e agitador cultural em Ilhéus/Itabuna, com livro novo na praça: Procura e outros poemas.  Lançamento da Mondrongo, a editora do Teatro Popular de Ilhéus, com apresentação de Cláudia Cordeiro.
Felicíssimo joga suas apostas na retranca pela ‘Procura’ de um novo fazer poético, garimpando o gênero inventado pelo poeta pernambucano Alberto da Cunha Melo [1942-2007]. Cunha Melo cultivou o metro octassílabo obsessivamente em sua obra e registrou-os numa forma fixa, a que denominou retranca. Sua forma é de 4-2-3-2 versos, onde os dísticos têm rimas parelhas e as outras estrofes rimas alternadas [versos 2 & 4 na quadra e 1 & 3 no terceto].
Imagino que quem gosta do soneto deverá gostar muito também da retranca.  [Nada a ver com o feio esquema tático adotado e adorado pelos nossos técnicos vacilantes e preocupadíssimos em segurar seus empregos nos times de futebol, jogando trancados na defesa e à espera de contra-ataques.]
A retranca inventada por Cunha Melo, que também era jornalista, muito provavelmente, foi assim batizada com inspiração na retranca jornalística, texto sintético [pequena frase ou até mesmo uma palavra] que se usa sobre o título para apresentar o tema da matéria. Já as informações complementares, análise ou contextualização [que vem logo abaixo do título] é chamada de sub-retranca, ‘dialogando’ sempre com o título. Acredito que esse caráter sintético da retranca e da sub-retranca jornalística tenha pesado na opção do nome pelo seu criador, poeta e jornalista.
O gênero poético que ele inventou resulta numa poesia breve e de leitura facilitada, e vem sendo redescoberto e divulgado por novos poetas como Gustavo Felicíssimo.
Como quem ‘Procura’ acha, transcrevo, a título ilustrativo, dois poemas pinçados das páginas 30 e 31 do seu livro. A primeira retranca lembra o escritor mexicano, Juan Rulfo {1917-1986}, que impôs definitivamente o seu nome na melhor literatura do planeta com duas obras magníficas: ‘Llano em llamas’ [‘Chão em chamas’, contos, 1953] e ‘Pedro Párama’ [romance, 1955]. | Também fotógrafo de mão cheia, Juan Rulfo é o autor da foto que ilustra esta primeira transcrição-homenagem {ao próprio e aos voos do poeta, captados/cooptados por Gustavo Felicíssimo}.

COMO DIRIA JUAN RULFO


No começo o vento nos leva,
o vento nos deve levar
em suas asas sobre os campos
e nos ensinar a voar;

no tempo o vento se desfaz
e o voo, solitário, se apraz;

densa, na solidão do voo,
a lira não está completa,
o ocaso oferta um sobrevoo:

cortar e cortar sem pudor,
cortar sem acusar a dor.

A segunda retranca de Gustavo Felicíssimo homenageia o querido irmão em poesia Paulo Leminski [1944-1989], poeta em tempo integral enquanto viveu. Para ilustrar escolhi a foto de Dico Kremer que ilustra a capa de “O bandido que sabia latim”, biografia do Leminski pelo amigo Toninho Vaz.

REVISÃO DE LEMINSKI


Era um poeta iconoclasta
beijando modernos umbrais,
um samurai à brasileira
medindo o voejar dos pardais;

era como se não bastasse
e como em si não coubesse:

hoje canta e vive na praça,
na plenitude da palavra,
nos bares, nos becos da raça,

na luta de classes, nos livros:
anjo louco, poeta vivo.

[by Carlos Verçosa (poeta e jornalista), em manhã de saudades, 6 nov 2012]

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Breve resenha sobre Procura e Outros Poemas


Foi publicado ontem, no Jornal Correio da Paraíba, um texto escrito por Astier Basílio, jornalista e poeta que dispensa apresentações, sobre meu livro mais recente, Procura e Outros Poemas.

clique na imagem para ampliá-la

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Hoje - Lançamento duplo de livros e belo sarau na Academia de Letras da Bahia


Nesta terça-feira, 28, lanço em Salvador, na Academia de Letras da Bahia, a partir das 19 horas, o livro Procura e Outros Poemas (Mondrongo Livros, 88p. R$ 20,00). Na oportunidade também será apresentada ao público a obra Cantos deContar (Editora Paés, RS 50,00), obra inédita (com capa dura e numerada) de Alberto da Cunha Melo. Haverá a participação de Cláudia Cordeiro (viúva e musa do poeta), Silvério Duque e eu, sob mediação de Walter Ramos, em que será debatida a obra de Alberto. O evento ainda contará com a participação de Marcela Martinez em um recital poético.
Como se pode ver, a noite promete ser muito agradável e todos estão convidados. Mais informações AQUI.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Um inédito de Alberto da Cunha Melo

         Neste ano, em que se vivo estivesse, Alberto da Cunha Melo completaria 70 anos de vida, a Editora Paés, de Pernambuco, terra natal do poeta, lança em Salvador e Recife, Cantos de Contar, em uma justa homenagem a esse que foi, seguramente, um dos melhores poetas surgidos no Brasil nos últimos tempos.
         A mim esses eventos trazem uma alegria dupla, primeiramente por poder receber Cláudia Cordeiro (musa e viúva do poeta) e o livro, tão bem cuidado por ela e a trupe da Paés, depois, pelo fato de ter a oportunidade de levar meu livro mais recente, Procura e Outros Poemas, ao público e amigos de Salvador e Recife, obra que é toda construída por Retrancas, forma poética e estrófica criada por Alberto da Cunha Melo.

terça-feira, 17 de julho de 2012

Primeiras notícias sobre meu próximo livro


Vejam que beleza a capa do meu próximo livro. A fotografia é de Jamison Pedra e foi escolhida por dialogar bem com certo aspecto de solitude que retrata o homem fragmentado, objetivo maior de Procura e Outros Poemas, sobre o qual o poeta Ângelo Monteiro, de Pernambuco, disse o seguinte: "Gustavo Felicíssimo se tornou um verdadeiro continuador da Retranca, esta forma estrófica que, inventada por Alberto da Cunha Melo, constituiu a matéria prima de, pelo menos, duas de suas obras fundamentais — Meditação sob os lajedos e Yacala — e que ganhou no autor de Procura e Outros Poemas um componente lúdico e graciosamente aleatório que veio dar ao seu livro uma nota pessoal à fórmula albertiana".
         O lançamento acontecerá na Feira do Livro de Ilhéus, dia 10 de Agosto.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Uma imagem para a história


        Revisitando o site PLATAFORMA PARA A POESIA, todo reformulado, e com um conteúdo pra lá de formidável, encontro essa fotografia – tirada por Cláudia Cordeiro – que é o flagrante e testemunho excepcional de um instante, onde se encontram nada menos que dois dos maiores poetas da história recente do Brasil: Alberto da Cunha Melo e Bruno Tolentino. Ambos fazem parte da minha formação de poeta e leitor. Alberto, pela maneira ao mesmo tempo simples e sofisticada de tratar alguns dos temas basilares da nossa existência. Bruno, pela sua cultura e coragem com que enfrentou o debate sobre a literatura no Brasil. Abaixo, um poema de cada um desses gênios.

CASA VAZIA
Alberto da Cunha Melo

Poema nenhum, nunca mais
será um acontecimento:
escrevemos cada vez mais
para um mundo cada vez menos,

para esse público de ermos,
composto apenas de nós mesmos,

uns joões batistas a pregar
para as dobras de suas túnicas,
seu deserto particular;

ou cães latindo, noite e dia,
dentro de uma casa vazia.


Nihil Obstat
Bruno Tolentino

É preciso que a música aparente
no vaso harmonizado pelo oleiro
seja perfeitamente consistente
com o gesto interior, seu companheiro

e fazedor. O vaso encerra o cheiro
e os ritmos da terra e da semente
porque antes de ser forma foi primeiro
humildade de barro paciente.

Deus, que concebe o cântaro e o separa
da argila lentamente, foi fazendo
do meu aprendizado o Seu compêndio

de opacidades cada vez mais claras,
e com silêncios sempre mais esplêndidos
foi limando, aguçando o que escutara.

quinta-feira, 15 de março de 2012

O Presente


Alberto da Cunha Melo

O que hoje recebes
e não podes pegar, guardar
em panos e papéis laminados,
é imperecível,
presente onipresente.
Estás com ele na chuva
e não temes que se desfaça.
Estás com ele na multidão
e não o escondes dos mutilados.
O que não existe para os homens
deles estará protegido,
o que os homens não vêem
não poderão espedaçar.
Eis o que não te denuncia
porque não tem face
nem volume para ser jogado no mar.
Eis o que é jovem a cada lembrança
porque não tem data
e série, para envelhecer.
O que hoje recebes
não pode ser devolvido.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

O surfista


Kelly Slater, o maior vencedor do surfe mundial, comemorou neste último sábado (11), 40 anos. Trata-se de um fenômeno, dono de 11 títulos mundiais e dez recordes na história do surfe. A data foi lembrada pelos principais meios de comunicação do mundo e, só pra variar, me fez recordar um poema, dessa vez de Alberto da Cunha Melo, intitulado, justamente, O Surfista. Trata-se de uma retranca, forma poética composta de onze versos octossílabos, criada pelo próprio Alberto, que é um dos poetas brasileiros que mais gosto.
O octossílabo dá ao poema uma cadência, um ritmo que o autor desestabiliza propositalmente, alternando a cesura medial dos versos, que ora se encontram na quarta sílaba, ora na terceira e até na quinta, recurso que nos faz pensar na instabilidade própria do surfe.
No poema, algumas metáforas redimensionam o esporte, em que o surfista, com a sua prancha “desliza como uma lágrima” sobre o “instável chão do mundo”. Já o dístico final sustenta aquela imagem de que surfistas sempre estão acompanhados por lindas mulheres, “presente do oceano”. Realidade ou não, pelo menos o Kelly Slater sempre andou acompanhado por verdadeiras sereias. Em sua lista de namoradas, nomes famosos: a atriz americana Pamela Anderson e Gisele Bündchen. Sua atual companheira é Kalani Miller, uma californiana de 20 e poucos anos e dona de uma grife de biquínis.

O surfista
Alberto da Cunha Melo

Equilibrado sobre a folha
que desliza como uma lágrima
pela face daquela onda,
a mais esperada, a mais alta,

ama esse instável chão do mundo
que lhe falta a cada segundo,

e as paredes de transparência,
que almas e corpos atravessam
ao sol da súbita inocência:

na praia, fêmeas o esperando,
como um presente do oceano.

Em: Dois caminhos e uma oração (2003). Pág. 126. Editora A Girafa.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Oração pelo poema - Poema Nº 1


Alberto da Cunha Melo

Escrevo de cabeça baixa
por que levantá-la depois?
Não o faça para ser visto
pelos que passarem na estrada.

Viver na mesma posição
mas deixando a alma sair
pelos olhos e pela boca,
como água a jorrar de uma estátua.

Este é o tempo em que Deus regressa
pelos quatro cantos da casa.
Vem desenterrar o poema
do meu corpo e gritar comigo.

Recebe-o diante do espanto
dos amigos que não o vêem,
tenho gestos incompreensíveis
e digo coisas já remotas:

Senhor, protege meu poema
e obscurece com tua sombra
os versos mortos, as palavras
que sobram, o tempo perdido.

Relação externa:
Poema único, dividido em 30 partes, é um dos mais belos da obra de Alberto da Cunha Melo. Foi escrito no verão de 1967 e publicado originalmente em 1969, em separata da revista Estudos Universitários, da Universidade Federal de Pernambuco. Está disponível, AQUI

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Confissão de um velho boêmio


Toda vida devia ser
uma festa sem fim, velório
festivo da morte do tempo,
fogueira de azuis, crematório

ou, mesmo, hospital de lembranças
dos que nunca foram crianças,

e pularam toda a pureza,
ao invés de pular a corda,
dançar nas horas da beleza;

dos que hoje morrem sem saber
que festa acabam de perder.

Alberto da Cunha Melo

Saiba mais sobre esse formidável poeta clicando AQUI.