Não
tivesse falecido tão precocemente, Carlos Pena Filho teria recebido mais
atenção e destaque dentro da lírica brasileira, pois não se encaixando entre o
modernismo e a Geração de 45, seus sonetos oscilam do cânone à pesquisa, com
surpreendente independência para a idade em que estreou.
De
sua lavra, muitos poemas me agradam e a eles retorno inúmeras vezes ao ano,
como o Soneto para Greta Garbo e o clássico Soneto do desmantelo azul.
Entretanto, pelo específico da data, faço hoje o que deveria ter feito ontem, publico
o Soneto da Sexta-feira da paixão, uma pintura encontrada no seu espólio entre
diversos fragmentos. Neste poema final, como afirma Edilberto Coutinho, o poeta
parece “pressentir a morte, como se já tivesse enxergado o germe da indesejada
no seio das rosas de seus versos[1]”.
Soneto
da Sexta-feira da paixão
Carlos
Pena Filho
Morto. Como também já
morre o dia.
Mas continua a ser
noutros lugares?
Ou morto diariamente
nos altares,
por ser diversa a morte
que morria?
O corpo morto: azul
melancolia
do mesmo azul perdido
pelos ares,
vivo azul sobre os
campos, sobre os mares,
sobre a clara manhã e a
hora tardia.
Um corpo morto. Um
corpo morto de homem,
igual a esses cadáveres
da guerra
que as batalhas atraem
e consomem?
Ou um que junta o mundo
à sua sorte,
contempla a sombra em
torno e desce à terra
e morre em solidão e
vence a morte?
[1] Em:
Os melhores poemas de Carlos Pena Filho / Seleção de Edilberto Coutinho, Editora
Global, 2000.
Nenhum comentário:
Postar um comentário