domingo, 14 de março de 2010

Ao Poeta Castro Alves

neste dia nacional da poesia

I

Por que vieste assim, tão frágil,
sua vida beijando a morte,
se bebeu do leite da escrava
e se podia melhor sorte;

por que partiste muito jovem
se teus versos é que nos movem,

se teu canto é que nos conduz
sobre o éter dos novos dias,
caminho ao encontro da luz,

e por que não, sopro de vida
em meio à plêiade perdida?


II

Se nesta terra miserável,
irmã gêmea das asperezas,
floresce ainda a indiferença,
como cantar suas belezas

com ternura, feito um romântico,
se lá fora, de um modo drástico,

padece à luz do sol, à luz
da lua, o mesmo cativo,
o mesmo irmão de Jesus,

imagem e filho de um Deus
que insiste em faltar com os seus?


III

Se me disseres, nuvem negra,
que se amassa com os dois pés
o pão nosso de cada dia,
que na argamassa, a pontapés,

vai misturada toda angústia
para que seja a eucaristia

a comunhão dos desgraçados,
retrato fiel, sem retoque,
do firmamento desbotado;

devo crer, ainda, na fala
dessa voz grave que não cala?


IV

O que não muda com o tempo,
esperança estúpida e vã,
mudará mais o pensamento
na permanência do amanhã

ou será cera em nossas asas,
epitáfio em nossas covas rasas

porque jaz, muito a contragosto,
quem sobrevive nesta terra
e morre flébil, de desgosto,

por mentir com intensidade
antes de dizer a verdade?

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